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quarta-feira, 14 de abril de 2010

Cenário pós-crise

Retomada de investimentos está atrelada à expansão sustentável do consumo doméstico.


Por Ivo Ribeiro
Valor econômico

O Brasil, líder absoluto na produção de aço na América Latina, tem tudo para se tornar a maior força desse setor nas Américas, abrigando a maioria dos novos empreendimentos para fabricação do metal. Líder atual na região, os EUA - donos de um imenso e cobiçado mercado de aço -, perdem atrativos para fazer produtos semiacabados, assim como os países da Europa. Os custos são elevados e as restrições, ambientais e de outros tipos, cada vez maiores, levando o país a uma especialização em produtos acabados. Ao lado da Índia e da China, "hors concours" no setor, o Brasil se destaca como potência emergente nessa indústria de capital intensivo, mas tem pela frente muitos desafios a superar. O setor debate esses desafios a partir de hoje no Congresso Brasileiro do Aço - 21ª Edição e ExpoAço 2010, em São Paulo, eventos promovidos pelo Instituto Aço Brasil (IABr).

Vastas reservas de minério de ferro, uma longa costa oceânica e grupos locais sólidos financeiramente, dentre outros fatores, fazem parte da lista de atrativos do país. Porém, ainda existem problemas que vão da falta de uma ampla e democrática rede logística (ferrovias e portos) até uma política setorial clara para desenvolver a nova onda de oportunidades que surge mais intensa após a crise global. Diante disso, muitas vezes, o Brasil torna-se alvo de pressões políticas que buscam atender mais a interesses de curto prazo. O novo cenário, avalia-se, requer mais planejamento.

Para que o setor dê seu grande salto, um dos entraves a ser eliminados é a estagnação do consumo doméstico, afirma André Gerdau Johannpeter, que amanhã assume o cargo de presidente do conselho diretor do IABr. Pela primeira vez à frente da entidade e desde 2007 na presidência do grupo Gerdau, o empresário vê crescimento sustentável do mercado interno como fundamental. "Queremos e estamos preparados para acompanhar a onda de crescimento do país."

O consumo interno patina por três décadas, ora pouco acima ora pouco abaixo de 100 quilos por habitante ao ano. Perde para países como México e Argentina, e viu, nesse período, a China saltar de 40 para mais de 300 quilos por habitante ao ano.

Com a crise mundial que abalou a indústria do aço, o consumo local caiu de 24 milhões de toneladas, em 2008, para 18,5 milhões (96 quilos por habitante) em 2009. A previsão para 2010 é de 22,9 milhões de toneladas (116 quilos).

No continente latinoamericano, o Brasil domina a onda de investimentos. Germano Mendes de Paula, professor-doutor da Universidade Federal de Uberlândia e um dos maiores especialistas no setor, informa que dos 85 projetos anunciados e em curso desde 2009, mais da metade (44) está no Brasil. Vão abranger desde novas usinas de aço, expansões, unidades de laminação, até modernização de equipamentos de aciarias e laminadores de produtos.

"Pode ser que alguns dos projetos dessa leva nem saiam do papel, mas isso mostra a liderança e a força do país na região", diz. A retomada de investimentos no setor no Brasil, a seu ver, está atrelada a dois fatores: expansão sustentável do consumo doméstico - superando o "stop and go" de mais de duas décadas - e a atração para fabricação de aço semiacabado, em especial placas. "Com um consumo per capita sustentável que, por exemplo, dobre até 2020, o Brasil será um grande alvo de atração de investimentos", analisa.

Já a atração para fabricar aço semiacabado, afirma, vai depender das estratégias dos grupos siderúrgicos. "Será que eles vão desenvolver bilionários projetos para competir no pequeno e pouco rentável mercado mundial de placas, ou para substituir obsoletos altos-fornos e suprir laminações na Europa e EUA?", pergunta. É o caso da ThyssenKrupp, cuja usina da CSA, no Rio, visa abastecer unidades alemãs e uma nova americana. Por sua vez, a ArcelorMittal parece olhar para ambos ao investir no país: o mercado interno e o custo competitivo de produção de semiacabados. Em 2009, com o grupo sob forte impacto da crise, as unidades do Brasil garantiram 35% do seu resultado operacional.

Até 2016, segundo o IABr, o país tem um programa de investimentos anunciados e em andamento de US$ 39,8 bilhões apenas no aumento da produção de aço. Com isso, a atual capacidade, de 42 milhões de toneladas, passaria para 77 milhões de toneladas, caso todos se concretizem. A sobra de aço em relação à demanda doméstica prevista ficaria em 104%, comparado aos 91% projetados para 2010.

Um especialista do setor aponta a pesada tributação existente no país sobre investimentos em novos projetos. "Para um setor de capital intensivo como o aço, é inconcebível. Exige-se pagar o imposto antecipadamente", afirma. Além disso, observa, o custo do dinheiro no Brasil é bem acima do que é pago pelos competidores da empresas locais. O gargalo na infraestrutura do país é consenso.

Um analista ouvido avalia que o Brasil está fora do jogo da consolidação, apesar de ter empresas de excelente nível. Segundo ele, contudo, elas não dispõem de escala global para participar desse jogo. O que mais pesa é sua estrutura societária, controlada por grupos familiares, fundos e estatais. Nesse caso encaixam-se CSN, Gerdau e Usiminas e até mesmo a Vale. "Como não dispõe de ações para uma operação de troca, um passo ousado é barrado na falta de capital - para fazer aquisição terá de se endividar ou esperar acumular geração de caixa."

A avaliação é que o Brasil exibe uma tendência natural para se transformar num polo mundial de atração de investimentos na siderurgia, em especial na oferta de produtos semiacabados, por deter a matéria-prima. Mas precisa ser parte da política estratégica das siderúrgicas internacionais, que têm a sua lógica global. "O Brasil deveria discutir essas vantagens dentro de uma política de agregação de valor da matéria-prima, o minério", avalia esta fonte.

Para o presidente da Gerdau, o câmbio é um fator de preocupação, pois ameaça toda a cadeia, desde siderúrgicas, com entrada de aço, até fabricantes de autopeças, linha branca e máquinas, favorecendo a importação de componentes. Ao mesmo tempo, afirma, reduz a competitividade das exportações do país.

A desoneração da carga tributária foi e continuará a ser uma bandeira do IABr. "Espero que a discussão do tema seja retomada após as eleições, com a mudança no Executivo e Legislativo." Para o empresário, é preciso mais desoneração para trazer mais competitividade ao país. "Vimos o efeito disso no consumo durante a crise."

Marco Antônio Castello Branco, que fica à frente da presidência da Usiminas até o fim deste mês, destacou que as ameaças para o setor no pós-crise são as mesmas vistas antes da crise - perda de competitividade devido ao câmbio, debilidade do sistema de defesa comercial (o que pode permitir eventual aumento sem controle de importações), sistema tributário anacrônico e parca infraestrutura.

Para o executivo, a siderurgia vai passar pela mesma transformação estrutural que mudou a indústria mundial do alumínio, cobre e níquel. "A mineração tenta capturar para si o máximo do lucro gerado pelo aço." Por isso, a verticalização ficará ainda mais atrativa.





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